Pesquisa revela avanços e desafios no atendimento ao parto no Brasil

A prática hospitalar no Brasil passou por mudanças significativas nos últimos dez anos. Dados da maior pesquisa sobre parto e nascimento do país, a Nascer no Brasil 2, realizada pela Fiocruz com mais de 22 mil mulheres entre 2021 e 2023, mostram queda expressiva em intervenções consideradas desnecessárias e de risco.

A realização da episiotomia — corte no canal vaginal com bisturi — caiu de 47% para 7% nos partos vaginais realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A redução também foi observada na manobra de Kristeller, quando o profissional empurra a barriga da gestante para acelerar o nascimento: de 36% para 9% no SUS e apenas 2% na rede privada. Ambas as práticas são hoje classificadas como violência obstétrica.

Novas práticas no parto

Segundo a coordenadora-geral da pesquisa, Maria do Carmo Leal, houve adesão crescente a métodos que favorecem o bem-estar da parturiente e do bebê. “No Rio de Janeiro, não tem mais aquela forma de parir em litotomia, com a mulher de pernas para cima, sem poder fazer força. É uma mudança de cultura que estamos vendo, fruto de políticas públicas”, destacou.

A pesquisa também indica aumento no número de mulheres que puderam se movimentar e se alimentar durante o trabalho de parto. Além disso, quase todas optaram por posições verticalizadas, que facilitam a saída do bebê.

Desafios persistentes

Apesar dos avanços, a queda no acesso à analgesia preocupa. No SUS, o uso caiu de 7% para 2%, e no Rio chegou a apenas 1%. Na rede privada, a redução foi de 42% para 33% em nível nacional. O estudo aponta que a analgesia pode contribuir para aumentar as chances de parto vaginal.

Outro ponto crítico é a alta taxa de cesarianas. No SUS, o índice subiu de 43% para 48% — embora parte desse aumento se refira a cirurgias intraparto. Já na rede privada, 81% dos nascimentos no Brasil e 86% no Rio foram cesáreas, a maioria agendada antes do início do trabalho de parto. A recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é que o índice não ultrapasse 15%.

Lacunas no pré-natal

O levantamento também revela deficiências no acompanhamento das gestantes. Embora 98,5% das mulheres no Rio tenham realizado pré-natal, apenas um terço teve registros completos de aferição de pressão arterial e exames de glicemia — fundamentais para prevenir complicações como hipertensão e diabetes.

Menos de 34% receberam prescrição de ácido fólico, essencial para o desenvolvimento neurológico do feto, e apenas 31,6% foram vacinadas contra tétano e hepatite B. Entre as gestantes de alto risco, 75% nunca foram atendidas por especialistas.

“São mulheres que peregrinaram mais, porque não havia vaga e, principalmente, porque não estavam sendo encaminhadas para unidades adequadas. Peregrinar na hora do parto é tudo o que elas não tinham que fazer”, afirmou Maria do Carmo Leal.

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