Mauro Mendes quer “desfederalização” do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães

É a primeira vez que um parque federal seria transformado em estadual no País, aponta Rede Pró-Unidades de Conservação. Alteração pode diminuir poder de acionar mecanismos de proteção

O Parque Nacional (Parna) da Chapada dos Guimarães pode deixar de ser uma Unidade de Conservação (UC) federal para se tornar uma UC estadual. Isso porque o governador Mauro Mendes (União Brasil-MT) está solicitando a transferência da área protegida para o Estado de Mato Grosso.

Situada na bacia hidrográfica do Alto Paraguai, o Parna protege as cabeceiras do rio Cuiabá, um dos principais formadores do Pantanal. Além disso, a UC ainda ajuda a proteger uma importante área remanescente de Cerrado, entre o Pantanal e a Amazônia.

O pedido de “desfederalização” foi feito por Mendes ao ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, nesta quinta-feira (26), durante reunião no Palácio da Alvorada, em Brasília. A solicitação também teve o apoio dos senadores Jayme Campos (União Brasil-MT) e Wellington Fagundes (PL-MT).

“Temos recursos para investir R$ 50 milhões ao ano no parque. São R$ 200 milhões em quatro anos”, disse o chefe do Executivo Estadual.

O requerimento já tinha sido feito várias vezes durante a gestão Bolsonaro, como informou a assessoria do governador. Mas o pedido não foi acatado, sendo a UC apenas concedida à iniciativa privada no ano passado. “[…] essa concessão, estranhamente, prevê um investimento de R$ 18 milhões em 30 anos”, disse Mendes.

Para o governador, os investimentos previstos pela concessão são “mínimos” e não conseguirão promover “mudanças necessárias para alavancar o turismo” em Chapada dos Guimarães (MT), considerado pelo Executivo Estadual como um dos maiores atrativos do estado e “peça fundamental” na estratégia de desenvolvimento turístico no Pantanal e em Mato Grosso.

Ainda hoje (27), Mendes deve se reunir com a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Marina Silva, com quem também deve tratar sobre o tema, e pedir o cancelamento da concessão feita à Parques FIP (Fundo de Investimento em Participações).

De federal para estadual, menos poder

Segundo a Rede Pró-Unidades de Conservação, organização não governamental (ONG) que atua com a proteção de áreas protegidas, esta seria a primeira vez na história que uma UC seria desfederalizada dentro do País.

“E não tem porque acontecer. Se tem presença do ICMBio, Prevfogo, analistas ambientais, um parque que funciona, que gera visitação, uso público, benefícios para sociedade de uma forma geral, não tem porque esse parque deixar de ser federal e passar para o estado”, explica Angela Kuczach, diretora-executiva da ONG.

Ela esclarece que alteração de federal para estadual não modifica o status do parque, conforme as categorias do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Mas sendo federal, como atualmente é o Parna da Chapada dos Guimarães, um parque tem muito mais poder de acionar mecanismos de proteção.

Cidade de Pedra, no Parque Nacional da Chapada dos Guimarães. Foto: D’Laila/Sedec/Governo de Mato Grosso

“O Prevfogo é um mecanismo super importante que o Ibama, junto com o ICMBio, está envolvido para mandar reforços pras UCs. Tem toda uma esfera federal fortalecida, com analistas ambientais preparados, não que os analistas da Sema (Secretaria de Estado de Meio Ambiente) não sejam. Mas a gente está falando de duas estruturas que não têm comparação entre si, entre a Sema e o ICMBio, que é quem faz a gestão”, acrescenta Kuczach.

A diretora-executiva ainda aponta que os R$ 50 milhões previstos para serem investidos anualmente pelo Estado no Parna, no caso onde a “desfederalização” acontecesse,  superaria, e muito, o valor destinado a gestão estadual de todas as UCs de Mato Grosso ao longo de 2023, que é de R$ 8 milhões segundo levantamento feito pela própria Rede Pró-UC.

“Se o governo está investindo R$ 8 milhões em todo o seu sistema estadual de unidades de conservação, da onde que ele vai tirar R$ 200 milhões (R$ 50 milhões durante quatro anos) só pra um parque? E ainda que existisse esses R$ 200 milhões, o governo do estado do Mato Grosso deveria cuidar melhor das suas outras unidades de conservação”, defende ela ao mencionar casos como o do Parque Estadual do Cristalino II, extinto em processo que transitou em julgado — depois que o Executivo Estadual não recorreu de decisão que anulou a criação do Parque –, mas que depois foi restabelecido.

Kuczach diz esperar bom senso da ministra Marina Silva no encontro previsto com Mendes nesta sexta. “Porque de fato não há o menor sentido no pedido do governador Mauro Mendes para estadualizar o Parque Nacional da Chapada dos Guimarães”, conclui.

PEC que limita UCs

Como mostrou ((o))eco, o governador Mauro Mendes (União Brasil-MT) é autor da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 12/2022 que, na prática, limita a criação de novas UCs em Mato Grosso. A proposta prevê que a criação de novas áreas protegidas só poderá ocorrer após a regularização de 80% das unidades de conservação já criadas no estado.

Publicada na semana passada pelo Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad) e pelo Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT), uma nota jurídica apontou a PEC como inconstitucional por invadir competência da União e fragilizar a Política Estadual de Meio Ambiente.

Ainda neste mês, a PEC só não foi votada em primeira votação por conta de um pedido de vista do deputado estadual Lúdio Cabral (PT-MT). Como a atual legislatura termina no dia 31 de janeiro, uma nova votação só deve acontecer na próxima, que começa em fevereiro.

eco- Jornalismo ambiental

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