Foi somente 54 anos depois de ter escrito uma redação sobre como imaginava Brasília ao longo da década de 1970 que o servidor público aposentado Carlos Campelo, 71 anos, teve acesso ao material. O trabalho de escola escrito quando ele tinha 17 anos e estudava informática na 4ª Série do Ginásio do Caseb foi publicado em maio de 1970 em um suplemento especial do Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) – na época batizado apenas de Distrito Federal – sobre os dez anos do colégio.
“Para mim, foi motivo de muito orgulho, porque fui no caminho certo, fiz uma previsão antecipada e concretizada da atual capital do Brasil. Também fiquei muito feliz porque comecei a lembrar de tudo, até mandei o arquivo para toda a minha família”
Carlos Campelo, servidor público aposentado
Campelo só ficou sabendo do próprio feito este ano, graças ao resgate do conteúdo no acervo disponível no Sistema Integrado de Normas Jurídicas do Distrito Federal (Sinj-DF), que reúne arquivos de Brasília publicados desde 1957 no Diário Oficial da União (DOU) e, de 1960 até os dias de hoje, no DODF.
“Tenho uma ligeira lembrança desse texto, porque fazíamos muitas redações lá no Caseb. Mas nunca imaginei que tivesse sido publicado. Acho que a professora de português da época gostou e, como estava sendo comemorado o aniversário do colégio, selecionou a minha. Fiquei sabendo só agora, 54 anos depois”, afirma entre risos o homem.
O servidor público aposentado chegou a Brasília quando tinha 16 anos, vindo de Crateús, município do Ceará (CE), para se juntar ao restante da família que já residia na capital federal desde que a primogênita passou no concurso da Câmara dos Deputados. Na época, ele já havia se encantado pelo projeto arquitetônico de Brasília criado por Lucio Costa e Oscar Niemeyer.
“Para mim, foi motivo de muito orgulho, porque fui no caminho certo, fiz uma previsão antecipada e concretizada da atual capital do Brasil. Também fiquei muito feliz porque comecei a lembrar de tudo, até mandei o arquivo para toda a minha família”, conta. Na redação, ele imaginava a Asa Norte toda completa e uma cidade com 800 mil habitantes, expectativas próximas da realidade.
Acervo histórico
O mesmo suplemento que traz a redação de Carlos Campelo tem fotografias de professores, alunos e até do prefeito de Brasília, Israel Pinheiro, após a aula inaugural em 19 de abril de 1960, além de uma série de matérias informativas sobre a história e os serviços da escola – confira aqui.
O conteúdo foi encontrado pela coordenadora de Gestão Documental, Informação e Conhecimento da Secretaria de Economia (Seec-DF), Eliane Oliveira, durante uma de suas pesquisas na plataforma Sinj-DF. “É um sistema institucional de governo, mas sempre sentimos a necessidade de mostrar o potencial dele. Hoje ele nos alimenta com decretos, portarias, resoluções e instruções, mas esses dados também podem nos resultar narrativas e histórias. A partir daí surgiu a ideia de mostrar esse outro lado do sistema, e, pesquisando, me deparei com esse suplemento que me chamou atenção por ser comemorativo aos dez anos do Caseb”, revela.
Ao se deparar com as redações publicadas no diário, ela teve curiosidade de descobrir quem eram os autores. O nome de Carlos Campelo chamou atenção porque a coordenadora conseguiu também pelo Sinj a informação de que ele havia sido servidor do Governo do Distrito Federal (GDF). “Foi lá que eu descobri que ele era servidor distrital e auditor fiscal. Também foi no portal que tive acesso [à informação de] que ele havia se aposentado e ainda que a filha dele também era servidora e que tinha participado de um grupo de trabalho comigo”, lembra.
“É um sistema que faz parte da nossa rotina, mas que é uma fonte rica de informações, dados e conhecimento. As informações estão lá disponíveis para serem consultadas e darem origem à construção de narrativas”
Eliane Oliveira, coordenadora de Gestão Documental, Informação e Conhecimento
Só no primeiro semestre de 2024, a plataforma atingiu quase um milhão de acessos, um total de 961 mil. No ano passado foram registrados 3.897.258 acessos. “Antigamente, batíamos um milhão de acessos por ano. É um sistema muito consultado e que vem tendo uma crescente. É uma plataforma fácil e intuitiva que permite pesquisas refinadas e com combinações de filtros. É o único local onde o usuário pode ver tudo que aconteceu com uma legislação: alterações, revogações e atualizações”, explica a coordenadora.
Como funciona
O Sistema Integrado de Normas Jurídicas do Distrito Federal foi criado em 29 de dezembro de 2010 com a publicação do Decreto nº 32.704. A ferramenta permite consulta aberta aos diários oficiais e aos atos normativos neles publicados a partir da utilização de palavras-chave, número ou tipo de normas, entre outros argumentos de pesquisa, inclusive entre aspas, para refinar a busca do resultado. A depender da matéria, também é possível consultar alguns diários oficiais da União.
A plataforma surgiu para atender uma demanda dos órgãos do DF que, até então, utilizavam um portal do Senado Federal para catalogar essas informações. A ideia de reunir os dados veio em 2007 com a criação de um grupo de estudos para discutir a instituição do sistema único para a Secretaria de Economia do DF, o Tribunal de Contas do DF (TCDF), a Procuradoria-Geral do DF (PGDF) e a Câmara Legislativa do DF (CLDF). Em 2009 foi criado o comitê gestor, e, no ano seguinte, nasceu o Sinj-DF.
“Criamos um sistema que os quatro órgãos alimentam de forma conjunta e harmoniosa, respeitando regras e diminuindo o retrabalho. Conseguimos que cada órgão cuidasse de um tipo de informação legislativa, e estamos com esse cadastro desde então”, revela o supervisor de Legislação e Jurisprudência do TCDF, executor do contrato de manutenção e integrante do comitê gestor do Sinj-DF, Rodrigo Licursi.
Em 2014, o sistema passou por uma virada com a inclusão dos diários oficiais anteriores àquele ano. “O Tribunal de Contas vinha observando a necessidade de a sociedade ter acesso a esses diários, e bancou a digitalização de todos desde 1960. Eles foram incluídos no Sinj, o que permite uma pesquisa no texto dessas imagens colaborando e preservando a história do Distrito Federal”, comentou Licursi. A manutenção do sistema é de responsabilidade do TCDF.
Fonte: Agência Brasília