Um estudo realizado no Rio de Janeiro concluiu que a poluição do ar pode ter contribuído para a morte de 8,5% das crianças de até 5 anos de idade em três bairros densamente povoados da zona oeste da cidade. Os pesquisadores avaliaram o nível de material particulado fino (MP2,5) no ar, substância que causa doenças respiratórias e cardiovasculares.
A pesquisa, feita pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pela Universidade Veiga de Almeida (UVA), foi publicada no último mês de julho, no periódico científico americano Bulletin of Environmental Contamination and Toxicology.
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As análises se concentraram em três bairros da Zona Oeste do Rio de Janeiro: Bangu, Paciência e Santa Cruz. As regiões são consideradas estratégicas por reunirem alguns dos piores índices de qualidade do ar, por conta de topografia, queimadas, emissões veiculares e industriais. Além disso, são densamente povoadas e já possuem estações de monitoramento do ar em atividade.
Poluição acima do limite
Os dados foram registrados entre abril e novembro de 2023, período com baixa precipitação e piores condições de qualidade do ar, e as análises mostraram que as concentrações de MP2,5 foram superiores a 15 µg/m³ (microgramas por metro cúbico) em mais de 50% dos dias. Esse é o valor máximo recomendado para garantir uma boa qualidade do ar, segundo diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS).
O estudo, então, cruzou esses dados com informações do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Prefeitura do Rio de Janeiro. Entre as crianças de 1 a 5 anos, a taxa de mortalidade no período foi de 14,9 por mil nascidos vivos, sendo 28,2% e 5,3% das mortes causadas, respectivamente, por doenças respiratórias e doenças cardiovasculares.
Em seguida, os pesquisadores utilizaram o software AIRQ+, da OMS, que estima o quanto dos efeitos à saúde pode ser atribuído ao material particulado fino, o que permitiu que chegassem ao percentual de 8,5% de mortes de crianças provocadas pelos níveis altos de MP2,5.
“O material particulado fino é um dos mais críticos que nós temos. É uma partícula muito pequena [diâmetro igual ou inferior a 2,5 micrômetros, ou 50 vezes menor que a espessura de um fio de cabelo]. Ele consegue alcançar e penetrar pulmões e correntes sanguíneas. E é muito prejudicial à saúde”, explica o professor e pesquisador de Ciências do Meio Ambiente da UVA Cleyton Martins.
“Pode provocar ou agravar doenças pulmonares como asma, bronquite, enfisema, doenças cardiovasculares e provocar câncer. Crianças são mais vulneráveis, por terem sistemas respiratórios e circulatórios ainda em desenvolvimento. Elas são mais suscetíveis aos riscos e efeitos desse tipo de material. População idosa também, com sistema respiratório e imunológico mais comprometidos”, complementa.
O pesquisador, que liderou o estudo ao lado da professora do Instituto de Química da UFRJ Graciela Arbilla, reforça a necessidade de planos de gestão e monitoramento de qualidade do ar mais eficientes, principalmente para proteger populações vulneráveis.
“Esse tipo de monitoramento deve abranger toda a cidade, principalmente as regiões mais críticas. Também deve considerar todos os poluentes legislados. Não posso medir como está a qualidade do ar sem conseguir monitorar tudo. E essa é a realidade em muitos lugares. Quando a gente pensa no Brasil como um todo, pode ser pior ainda. A maioria dos estados não faz esse monitoramento. Ou, quando faz, é muito incipiente”, diz Cleyton.
O pesquisador elogiou a a ampliação de monitoramento anunciada pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea), o que inclui material particulado fino em todas as estações de tratamento. “A partir disso, a gente consegue ter um diagnóstico mais real da situação, planejar fiscalizações, controle e tomada de ações efetivas”, finaliza.
Rafael Cardoso – Repórter da Agência Brasil