A possibilidade de os Estados Unidos bloquearem o sinal do sistema de geolocalização GPS no Brasil voltou a circular nas redes sociais, após aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro sugerirem que o país poderia ser alvo de sanções mais duras por parte do governo americano. Entre elas, estaria o corte do acesso ao GPS — tecnologia fundamental para diversos setores civis e militares.
A informação surgiu no contexto da recente revogação do visto do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), anunciada pelo secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio. Segundo parlamentares bolsonaristas ouvidos pela Folha de S.Paulo, representantes do Departamento de Estado teriam sinalizado que a medida seria “apenas o começo”.
Mas afinal, é possível tecnicamente cortar o sinal de GPS para um país inteiro? Especialistas em telecomunicações e sistemas aeroespaciais ouvidos pela BBC News Brasil afirmam que a medida é tecnicamente inviável e politicamente improvável.
Sistema global e de uso civil
O GPS (Global Positioning System) é um sistema de navegação por satélite desenvolvido pelo Departamento de Defesa dos EUA, originalmente com fins militares. Desde os anos 1990, passou a ser amplamente utilizado também por civis no mundo inteiro.
Com 24 satélites ativos distribuídos em seis órbitas ao redor da Terra, o GPS fornece informações de localização e tempo com alta precisão. Os sinais são transmitidos de forma contínua e unidirecional: do espaço para os receptores na superfície. Isso significa que o sinal alcança o planeta inteiro ao mesmo tempo, e não pode ser restrito de forma localizada sem consequências globais.
“É como uma transmissão de rádio aberta. Não é possível desligar o sinal apenas em um país, a menos que você o desligue para toda a região”, afirma Eduardo Tude, engenheiro e presidente da consultoria Teleco.
Medidas extremas e de guerra
Embora os Estados Unidos tenham a capacidade de degradar ou negar o acesso ao sinal civil do GPS em situações de conflito, isso é considerado um último recurso, utilizado apenas em contextos de guerra ou defesa estratégica.
Há ainda métodos como o jamming — interferência no sinal por meio de ondas de rádio — e o spoofing, que engana receptores com sinais falsos. No entanto, ambas as técnicas exigem infraestrutura no local-alvo, o que não seria aplicável ao Brasil sem configurar uma grave agressão internacional.
“Mesmo que os EUA desejassem restringir o acesso ao GPS no Brasil, isso exigiria medidas de guerra eletrônica em território estrangeiro. É improvável e diplomática e tecnicamente insustentável”, explica Luísa Santos, engenheira aeroespacial formada pela UBA.
Impacto global e alternativas
O bloqueio ao GPS traria impacto direto a setores como aviação, navegação, telecomunicações, logística, energia e finanças, todos dependentes do sistema para sincronização e localização. Além disso, os EUA também seriam afetados, dada a interdependência econômica e tecnológica entre os países.
O Brasil, assim como o restante do mundo, já utiliza sistemas alternativos ao GPS, como o GLONASS (Rússia), o BeiDou (China) e o Galileo (União Europeia), além de receptores compatíveis com múltiplas constelações de satélites.
“O GPS não é mais a única fonte de posicionamento global. Mesmo que houvesse uma interrupção, sistemas alternativos garantiriam continuidade nos serviços essenciais”, reforça Ana Apleiade, mestranda em astrofísica na USP.
Conclusão
Embora tecnicamente possível em situações extremas, o bloqueio do GPS no Brasil não é uma medida viável nem plausível no contexto atual. Além dos desafios técnicos, o impacto político, diplomático e econômico seria significativo para todas as partes envolvidas.
Até o momento, não há qualquer confirmação oficial de que os Estados Unidos cogitem esse tipo de sanção contra o Brasil.