Um estudo inédito realizado por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) revelou um avanço expressivo na prevenção do câncer do colo do útero no Brasil. A pesquisa, que analisou dados do Sistema Único de Saúde (SUS) entre 2019 e 2023, acompanhou mais de 60 milhões de mulheres por ano, com idades entre 20 e 24 anos, e constatou que a vacinação contra o papilomavírus humano (HPV) reduziu em 58% os casos de câncer e em 67% as lesões pré-cancerosas graves (NIC3).
O levantamento contou com apoio da Royal Society e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e teve seus resultados publicados na renomada revista científica The Lancet. Segundo os pesquisadores, o impacto positivo da imunização foi consistente mesmo entre mulheres mais jovens, antes da faixa etária recomendada para o rastreamento do câncer — que começa aos 25 anos.
“O impacto observado no Brasil confirma que a vacinação contra o HPV é eficaz não apenas em países de alta renda, mas também em contextos com recursos limitados. Esse é um passo fundamental rumo à eliminação global do câncer do colo do útero”, afirmam os autores do estudo, Thiago Cerqueira-Silva, Manoel Barral-Netto e Viviane Sampaio Boaventura, da Fiocruz Bahia.
Vacinação gratuita e novos públicos
O Brasil oferece a vacina contra o HPV gratuitamente desde 2014, por meio do Programa Nacional de Imunizações (PNI). A partir de 2024, o país adotou o esquema de dose única, seguindo recomendações internacionais. Já em 2025, as diretrizes ampliaram o público-alvo, incluindo adolescentes de 15 a 19 anos, usuários de PrEP, pessoas imunossuprimidas e pacientes com papilomatose respiratória recorrente.
A vacina está disponível nas unidades básicas de saúde e nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie), que atendem pessoas com HIV/Aids, transplantados e pacientes oncológicos de até 45 anos.
Prevenção e impacto social
O câncer do colo do útero continua sendo o segundo tipo mais comum entre as mulheres brasileiras e uma das principais causas de mortalidade feminina. A ampliação da cobertura vacinal é vista como uma das estratégias mais eficazes para reduzir desigualdades em saúde e salvar vidas, aproximando o Brasil da meta da Organização Mundial da Saúde (OMS) de eliminar a doença como problema de saúde pública.
Estima-se que entre 50% e 70% das pessoas sexualmente ativas entrem em contato com o HPV em algum momento da vida. A vacina, no entanto, pode oferecer proteção de até 98% contra os tipos mais perigosos do vírus — reforçando seu papel como uma das maiores conquistas da saúde pública brasileira.
“Vacinar é um ato de autocuidado, mas também de solidariedade coletiva. É proteger a si mesma e todas as mulheres que vêm depois”, reforça o texto do estudo, destacando o poder transformador da imunização.